Após mais de cinco anos de espera, o policial militar Rodrigo José de Matos Soares foi absolvido na madrugada deste sĂĄbado (9) das acusações de homicídio pela morte de Ăgatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, no Complexo do Alemão, em setembro de 2019. O julgamento, realizado no 1Âș Tribunal do Júri, no Centro do Rio de Janeiro, durou mais de 12 horas e resultou em uma decisão que gerou grande comoção e indignação entre os familiares da criança.
O trĂĄgico acidente ocorreu em setembro de 2019, quando Ăgatha estava com sua mãe dentro de uma Kombi na Comunidade da Fazendinha, no Complexo do Alemão. O cabo Soares, que estava em serviço, disparou seu fuzil durante uma operação no local, alegando que foi atacado por criminosos. Segundo as investigações, o policial teria confundido uma esquadria de alumínio carregada por um garupa de moto com uma arma, o que resultou no disparo. O tiro ricocheteou em um poste e entrou pela traseira da Kombi onde Ăgatha estava, atingindo-a nas costas e causando sua morte.
A defesa do policial sustentou que Soares agiu sob forte tensão, devido à morte de um colega PM dias antes, também no Complexo do Alemão. Para a defesa, o disparo foi um erro de julgamento, mas feito em legítima defesa, acreditando que a ação dos criminosos representava uma ameaça real.
O julgamento teve início na tarde de sexta-feira (8) e se estendeu até a madrugada do sĂĄbado. Durante o processo, o tribunal ouviu depoimentos de diversos policiais militares que estavam presentes na operação, que reforçaram a versão de um confronto com bandidos. A defesa também convocou peritos para esclarecer a dinâmica do disparo, enquanto testemunhas e familiares de Ăgatha contestaram essa versão, afirmando que não houve troca de tiros e que o disparo foi precipitado.
Vanessa Sales, mãe de Ăgatha, foi uma das primeiras a depor. Emocionada, ela descreveu o momento do acidente: "Eu não estava entendendo. Aconteceu um barulho que parecia uma bomba e ela gritando 'mãe, mãe, mãe'. Eu falando 'filha, calma'. E até hoje, quando eu chego em casa, sinto aquele vazio, aquele sentimento de que estĂĄ faltando", contou, visivelmente abalada.
Após horas de deliberação, o júri composto por sete jurados decidiu pela absolvição do policial Rodrigo José de Matos Soares. A sentença, lida por volta das 2h da madrugada deste sĂĄbado, gerou grande comoção entre os familiares de Ăgatha, que estavam na sala do tribunal. As lĂĄgrimas de tristeza e os gritos de indignação ecoaram pelo ambiente, enquanto os advogados do PM comemoravam a decisão.
A absolvição, no entanto, não apaga a dor da família de Ăgatha, que aguarda hĂĄ mais de cinco anos por justiça. O caso se tornou um símbolo da violĂȘncia policial nas comunidades carentes do Rio de Janeiro, especialmente no Complexo do Alemão, onde o uso excessivo da força por parte das autoridades tem sido frequentemente questionado. Para muitos, a decisão representa mais uma falha no sistema judicial, em um contexto de crescente desconfiança entre a população e a Polícia Militar.
O Complexo do Alemão é uma das ĂĄreas mais violentas e marcadas por confrontos entre policiais e criminosos no Rio de Janeiro. O caso de Ăgatha Félix trouxe à tona as questões da conduta policial nas favelas, onde operações frequentemente resultam em mortes e feridos, muitas vezes envolvendo civis inocentes. A absolvição do policial neste caso levanta novamente o debate sobre a falta de responsabilização dos agentes de segurança e a sensação de impunidade que predomina entre as comunidades afetadas pela violĂȘncia.
O caso ainda ecoa em vĂĄrias famílias que, como a de Ăgatha, sofrem com a perda de entes queridos em circunstâncias semelhantes, sem que haja justiça ou respostas claras sobre as responsabilidades dos envolvidos.
Com a absolvição, o policial Rodrigo Soares poderĂĄ seguir sua carreira sem enfrentar as acusações que pairaram sobre ele nos últimos anos. A defesa celebrou a decisão, considerando-a justa, argumentando que o policial agiu de acordo com o que acreditava ser uma situação de risco à sua vida. Para a família de Ăgatha, no entanto, a decisão foi um golpe profundo. "O sentimento de que a justiça não foi feita continua forte. Nós ainda esperamos que, um dia, o sistema realmente responda às nossas dores", afirmou Vanessa Sales, mãe de Ăgatha, em entrevista.